O álbum conta com a produção de Pupillo e participações de Kunumi MC e Elisapie
Edgar nos apresenta agora “Ultraleve” (Deck/Natura Musical), álbum que enfileira nove faixas produzidas mais uma vez pelo parceiro Pupillo Oliveira. “Ultraleve é uma maniçoba poética, demora mais de cinco dias no fogo da vaidade, com a panela cheia de água e empatia, cozinhando todos os sentimentos atravessados por um corpo negro em uma sociedade programada para o excluir e o matar“, diz o multiartista no texto de apresentação do trabalho.
Prato originário dos povos indígenas, maniçoba é a metáfora perfeita para as sensações que “Ultraleve” provoca, desde a primeira audição. Tal qual a maniva (folha da mandioca), cujo preparo pode levar até uma semana, “Ultraleve” requer calma e atenção. Assim como outras iguarias, não é no consumo rápido que se absorve suas propriedades: é um disco que exige ouvidos abertos e sistema digestivo preparado. As palavras de Edgar são acidez pura, abrasivas, deboche curtido em pH baixíssimo.
Os beats e percussão de Pupillo acompanham esse cozimento, criando ambiências sonoras ora irônicas, ora melancólicas, mas sempre enérgicas. É bonito prestar atenção em como ele responde aos plot twists narrativos de Edgar, surpreendendo também na estrutura de cada faixa, criando transições inesperadas. É como se eles estivessem construindo a trilha sonora de um game distópico, subvertendo o passado do funk, desde Afrika Bambattaa, e desenhando paisagens que alternam climas de acordo com cada “fase” do jogo.
Os materiais recicláveis que aparecem nas criações visuais de Edgar surgem em “Ultraleve” de outra maneira: objetos encontrados nas ruas de São Paulo por Edgar foram transformados em instrumentos e amplificados, adicionando efeitos às produções de Pupillo.
Acho desnecessário teorizar sobre a lírica de Edgar – para cada um seus versos batem de um jeito, e que assim seja. Mas há um discurso oculto que vale botar reparo: “Ultraleve” diz muita coisa nas entrelinhas de seus feats: Kunumi MC rima em guarani na faixa “Que A Natureza Nos Conduza”, e a cantora canadense Elisapie, uma artista e ativista inuíte, participa em “A Procissão dos Clones” cantando em seu idioma nativo.
Não, não sabemos o que eles estão cantando. Nem Edgar sabe. E essa falta, esse diálogo ausente, ou interrompido, é exatamente o que está por trás da escolha das participações. A ausência também tem o seu lugar no discurso de Edgar, e para isso também é preciso tempo, atenção e digestão.
Vozes gravadas no estúdio Space Blues por Alexandre Fontanetti
Vozes de Kunumí MC e Camila Pará Mirim gravados no estúdio Matéria Rima por Adilson Cardoso do Amaral
Mixado e masterizado por Carlos Trilha
Produção executiva por André Bourgeois (Urban Jungle)
Coordenação de produção por Michelle Marcelino (Urban Jungle)
Projeto gráfico por Renan Soares
Fotógrafo da capa por Evandro Gotaa
Contracapa por Luiz Garrido