O rapper escolheu o dia 13 de maio para mandar na lata da sociedade mais um trabalho com letras bem pensadas e bases empolgantes em que questiona os avanços contra o racismo com a profundidade de um espirito ancestral
Por Victor Viana
Já está disponível gratuitamente na internet “Preto Velho”, o novo EP do rapper Fábio Emecê. São quatro faixas daquele rap que, em contrapartida a produção midiática do momento, vem sendo chamado de rap adulto.
Fábio, que tem 36 anos, e também é professor de português do combalido sistema educacional do estado do Rio de janeiro, já é um veterano, começou nos idos de 2000 como vocalista da lendária Bandeira Negra, depois focou na sua produção autoral individual, onde a temática da resistência negra contra o racismo com uma pegada mais lírica que o comum no gênero. Mas não ache com isso que é um rap leve. O som de Fábio é pesadão, é cascudo e também chama atenção pela escolha refinada das bases.
Neste novo trabalho, que propositalmente é lançado no dia 13 de maio – onde se comemora a Lei Aurea, Fábio alerta que a escravidão de verdade ainda não acabou e que ela não virá como um presente oferecido pela burguesia branca. Sim; ela, a liberdade, terá de ser conquistada.
“13 de maio é uma data daquelas que a história brasileira sempre contou como feito e a cada minuto se configura como farsa porque os corpos que foram abolidos por força da lei, dos trabalhos forçados, também foram abolidos de moradia, desenvolvimento, cidadania e humanidade. ”, aprofunda e, sobre o nome do álbum, reforça: “Na umbanda seria dia de preto velho, o sábio, o conselheiro, o longevo, o que cura e aí cabe uma interpretação livre do seguinte: Saber os caminhos da liberdade é o grande trunfo dos pretos, enquanto povo”.
Há algum tempo Fábio tem como parceiro musical o produtor Dudu Fox, que está com ele em dois trabalhos anteriores e agora assina os beats de Preto Velho. As Mix e Master são de Flavio XL, além de participação especial de Thiago Ultra (Antiéticos) na faixa Safo.
O EP começa com uma introdução épica já te levando para o universo místico da Umbanda, emocionante mesmo. Em seguida a já citada Safo onde Fábio entra com seu estilo pessoal e original, com dicção perfeita, sem rivalizar com a intervenção de Thiago Ultra, formando mais uma simbiose que um dueto. Em Magia Real Fábio faz lembrar o trabalho feito também com Dudu Fox no álbum “Melodia do Luiz”, em que homenageiam o saudoso Luiz Melodia. A parceria de Fábio e do Dudu é um parêntese a parte, aproximou o rapper da música popular brasileira produzida na década de 70 e caiu como uma luva nos versos bem elaborados e profundos do professor Fábio.
O álbum fecha com a porrada sonora Último Beijo, versos rápidos sobre o orgulho negro e a crítica ao sistema político também dominado pelos brancos e que ousa se firmar sem legitimidade como representantes da causa, e tudo isso sobre uma base dançante. Verdadeiramente perfeita.
“Mc por vocação, professor por profissão, poeta por anunciação e preto com alma e emoção.”, assim Emecê se auto define e entrega mais um trabalho onde se percebe que o ativista, palestrante, DJ (ou discotecário, como prefere) da Festa do Malungo e idealizador e fundador do Sarau Reviravolta, o espaço cultural alternativo que acontece uma segunda-feira por mês em um botequim de Cabo Frio (terra natal dele) , está mais maduro, mais ácido, realmente ainda mais adulto, porém não menos lírico e não menos empolgante.